Bem
depois do final feliz
A série americana “Criminal
Minds” foi ao ar em 2005, tendo como fonte de inspiração as atividades de um
grupo de analistas comportamentais do FBI. O pano de fundo das suas análises é
o referencial teórico-prático das metodologias de base PSI. Assim desenvolvem
perfis para solucionar assassinatos seriais.
No que se refere a alguns desses
casos, é possível pensar e acreditar numa resolução bem-sucedida, por outro
lado, levando-se em conta estudos e atividades de uma abordagem de base
singular, esses procedimentos teriam de seguir por outras rotas de acolhimento,
estudo, pesquisa, além do dado padrão e as certezas freudianas, para
identificar muitos casos, até hoje insolúveis.
É claro que a série - muito bem
dirigida, com atores e atrizes magníficos, roteiros excepcionais - trata de
eventos bem-sucedidos com base em determinada fonte de inspiração teórica, onde
os personagens (elite cognitiva do FBI e os assassinos) se adequam ao olhar determinista
da metodologia aplicada.
Por outro lado, na mesma direção,
o pensador Yuval Noah Harari, autor da obra: “Sapiens - Uma breve história da
humanidade”, desenvolve um raciocínio, com base em fatos históricos, onde
identifica uma ameaça mortal a espécie humana: os próprios seres humanos, representados
pelo desenvolvimento do fenômeno conhecido como: Homo Sapiens.
O autor indica: “Não acredite nos
abraçadores de árvores, que afirmam que nossos ancestrais viveram em harmonia
com a natureza. Muito antes da Revolução Industrial, o Homo Sapiens já era o
recordista, entre todos os organismos, em levar as espécies de plantas e
animais mais importantes à extinção. Temos a honra duvidosa de ser a espécie
mais mortífera nos anais da biologia.” (Sapiens – Uma breve história da
humanidade”. Pág. 109).
Se eu sei que existem homens
santos e que a natureza humana pode ser boa? Sim sei e conheço alguns exemplos.
No entanto, esses mesmos exemplares da espécie, por não terem a violência e a
agressividade desenvolvidas para o extermínio de sua raça, podem ser facilmente
dominados e extintos por seus semelhantes de maior competência na área, ainda
mais com os avanços da tecnologia de guerra, armas químicas, etc... Algo
parecido com o que aconteceu com as espécies anteriores ao Homo Sapiens.
Talvez a educação pudesse
contribuir para reequilibrar a balança entre anjos e demônios, se não fossem as
iniciativas e investidas para permitir acesso a uma educação de qualidade
apenas aos escolhidos, via de regra com base no topo da pirâmide social, o que,
na realidade não garante nada, pois o ser singular parece determinar os avanços
de cada pessoa por este ou aquele caminho de vida, muitas vezes a margem dos
princípios de verdade.
Yuval Harari compartilha: “Isso
não quer dizer que tudo é possível. Forças geográficas, biológicas e econômicas
criam restrições. Mas, ainda assim, essas restrições deixam muito espaço para
desdobramentos inesperados, que não parecem ter ligação com qualquer lei
determinista.” (Sapiens – Uma breve história da humanidade. Pág. 323).
Essa observação se aproxima da
abordagem singular da Filosofia Clínica, ou seja, reivindica-se um olhar de
acolhimento investigativo, compreensivo, e singularizado, para decifrar o campo
do fenômeno humano, o qual é capaz de reinventar seu próprio meio cultural,
existencial, tendo como referência sua estrutura de pensamento em processo de
interação com seu ambiente.
A superação das restrições e
condicionamentos da cultura, tem a ver com as circunstâncias onde cada pessoa se
desenvolve existencialmente, em suas ideias, atitudes, seja de submissão,
subversão, criatividade, tradução, invenção de novos sistemas de convívio com
as lógicas da diferença.
O pensador ensina: “A disposição
para admitir ignorância tornou a ciência moderna mais dinâmica, versátil e
indagadora do que todas as tradições de conhecimento anteriores.” (Sapiens –
Uma breve história da humanidade. Pág. 341).
A base metodológica que contenha
uma redução fenomenológica (epoché dos gregos), como cautela de aproximação com
o fenômeno da singularidade, já seria bem-vindo, ou seja, teria como indicativo
preliminar um não saber, em busca de um estudo peculiar da pessoa ou grupo
social diante de si em processo.
Aqui se apresenta um
pré-requisito de plasticidade e capacidade de adaptação ao meio desconhecido,
algo que sugere uma inovação, no que se refere a proposta de conhecer as
pessoas, do lado de lá da relação. Levando-se em conta seu contexto cultural,
social, existencial, como uma imersão antropológica singularizada, distante das
classificações e tipologias apriorísticas reconhecidas.
O método fenomenológico, a analítica
da linguagem, a hermenêutica compreensiva, como fundamento, poderia ser aliada
dessa busca por acessar o fenômeno humano refugiado numa complexidade distante
de um saber que não sabe.
Yuval Harari cogita: “(...) a
desordem ecológica pode ameaçar a sobrevivência do próprio Homo Sapiens. O
aquecimento global, o aumento do nível dos oceanos e a poluição disseminada
podem tornar a Terra menos habitável para nossa própria espécie (...) outros
organismos estão se saindo muito bem. Ratos e baratas, por exemplo, estão em
seu apogeu. (...) Talvez daqui a 65 milhões de anos, ratos inteligentes olhem
para trás e sintam-se gratos pela dizimação causada pela humanidade (..)”.
(Sapiens – Uma breve história da humanidade. Págs. 470 e 471).
A constatação da evolução do
fenômeno humano conhecido como Homo Sapiens, ao destruir outras espécies para
se firmar, tem a ver com o alerta do pensador Yuval, pois lembra de que os
eventos atuais, já existiram noutras épocas, com nomes e recursos diferentes. Hoje
vivemos tempos de avançada tecnologia, seja em benefício do homem ou voltada
para a destruição em massa.
Essa capacidade de adaptação
requer um borogodó raramente desenvolvido por nossas bases educacionais.
Talvez devêssemos aprender com ratos e baratas, como fazem para sobreviver aos
ataques da química, da biologia humana. Seguem por aí, apesar das novas drogas,
venenos, parecem desenvolver contravenenos com aquilo que poderia ser o seu
fim.
Aquele abraço,
*hs