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Você está no espaço Descrituras. Aqui encontrará alguns textos publicados, inéditos e outros esboços de minha autoria. Tratam-se de manuscritos para estudo e pesquisa. Desejo boas leituras.

historicidade das publicações

segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 17*

                              O que você vê quando olha? 

Para acessar uma representação de mundo (Schopenhauer), não se trata de concordar ou discordar, aderir ou não aderir, odiar ou se apaixonar, mas aprender a conviver com as lógicas da diferença. Se você tem a curiosidade das pessoas inteligentes, poderá gostar de exercitar suas habilidades em comum acordo ou desacordo com essas linhas.

Aqui não se trata de agradar, desagradar, convencer, mas um convite para saber mais, conhecer alguns aspectos da lógica das contradições, desenvolver os próprios argumentos e reflexões, pensar diferente e isso não ser um crime. Ao conviver com outras formas de percepção das coisas, é possível ampliar o ângulo de visão.

Transitar por fenômenos até então desconsiderados, pode servir a um processo de autoconhecimento e descoberta de novas facetas da realidade. Talvez uma das maiores dificuldades para se compreender o conceito de singularidade, resida nos agendamentos históricos e sua proposta de controle pela generalização e classificação do fenômeno humano.  

A ilusão de se ter um controle sobre a natureza humana, tem produzido uma busca incessante pela manutenção e desenvolvimento das ciências humanas numa só direção (ideológica). Livros são escritos, filmes produzidos, peças de teatro e seus roteiros, tem servido para dizer o que e como pensar, como agir, o que comprar, no que acreditar, educando o olhar para ver sempre o mesmo em todo lugar.

As tipologias - recheadas de fundamento - ao buscar um padrão para a diferença, servem as ideologias do consumo, transformando sujeito em objeto. Vale lembrar uma das definições psiquiátricas para se ter uma pessoa saudável: o fato dela ser ou não produtiva.

Um exemplo dos obstáculos para se pensar a singularidade é o caso das comunidades LGBTQIA+, ou seja, mesmo quem busca uma identidade, acaba reivindicando uma classificação para se ver representado. Penso que, se tivéssemos uma sociedade não tipológica, as pessoas poderiam ser reconhecidas pelo nome, sobrenome, e não pela cor da pele, raça, orientação sexual, gênero, religião, política... Quem sabe assim o convívio dos princípios de verdade com a expressividade se tornasse acolhedor, agradável, humano.

O tópico busca de nossos dias, dentre outras coisas, sugere um encaminhamento veloz para a fabricação de humanoides. Veja-se o caso do desenvolvimento tecnológico, o qual se assemelha a uma Ferrari ou Lamborghini em relação a vida da maioria das pessoas e suas carroças da idade média.

Ao mencionar essa realidade, talvez a lógica das contradições, possa realizar o milagre de desconstruir os prognósticos que se avizinham. Nesse sentido, esse texto estar equivocado pode significar algo a mais, em meio a cegueira coletiva ao redor da fogueira.  

Aquele abraço,

*hs  

   

sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 16*

                           Quem ou o que descreve a sua história? 

Em seu texto ‘A casa dos loucos’ Michel Foucault ensina: “No fundo da prática científica existe um discurso que diz: ‘Nem tudo é verdadeiro; mas em todo lugar e a todo momento existe uma verdade a ser dita e a ser vista, uma verdade talvez adormecida, mas que, no entanto, está somente à espera de nosso olhar para aparecer, à espera de nossa mão para ser desvelada. A nós cabe achar a boa perspectiva, o ângulo correto, os instrumentos necessários, pois de qualquer maneira ela está presente aqui e em todo lugar.’” (Microfísica do poder, 1990. Pág. 113).  

Se pensarmos na realidade latino-americana, da qual fazemos parte, é possível cogitar sobre a cegueira existencial de nossos dias. Levados por um espírito de rebanho, frequenta-se, cada vez mais as redes sociais, igrejas, farmácias, festas rave, manicômios...  

O governo anterior do Brasil - sabendo o que estava fazendo - vetou disciplinas como: Filosofia, Sociologia, História e afins, dos currículos escolares. Um sistema de ensino capenga e refém de profissionais despreparados (veja-se a lógica EAD), multiplica o espírito de faz de conta. Por outro lado - em sua maioria periféricas - as famílias se multiplicam como “cucarachas” (Henfil - Diário de um cucaracha).

Veja-se o caso da universidade - instituição que poderia fazer a diferença -, a qual se encontra (em nosso país) submissa a camisa de força do MEC, professores reféns da lógica contracheque, homenagens ao sr. diretor, chefias de departamento, publicações indexadas (quase ninguém lê!).   

Uma questão: ‘O que acontece quando, apesar desse contexto, ainda assim, aparecem novos paradigmas, invenções, maestrias no mundo da ciência, nas belas artes, na música, no teatro...?’ O que tenho escutado: “A maioria encontra o caminho da estrada, alguns se refugiam nalgum lugar para proteger suas ideias, pesquisas, práticas, outros fazem outras coisas”. Penso eu: ‘Na multidão se vivencia uma solidão compartilhada’.

Nossos dias se assemelham a caverna de Platão (428 a.C.-347 a.C), onde as pessoas, amarradas umas às outras, viviam as imagens refletidas no fundo da caverna... Se alguém conseguisse reencontrar a vida lá fora, ao regressar seria encaminhado a ‘casa dos loucos’, onde seus delírios seriam normalizados pelo pajé alienista. Ainda assim, esses inéditos seguem imprimindo seus sinais por aí.    

Nesse sentido, uma perspectiva fenomenológica, de hermenêutica compreensiva, analítica, divulgadas em palestras e cursos, inovações, curas, ainda é experienciado por poucos. Talvez uma educação voltada para as descrições e acolhimento da singularidade pudesse anunciar melhorias. Lembrando que isso tudo já estava borrado quando chegamos por aqui. Agora nos resta ir até o fim, deixando algumas pistas do que conseguimos vislumbrar e compartilhar pelo caminho.

Aquele abraço,

*hs  

domingo, 14 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 15*

 

                       Sobre anjos, demônios e seus disfarces

A história é rica em fatos envolvendo uns e outros. O âmbito das possibilidades costuma estar associado a uma interseção da pessoa com as circunstâncias históricas onde viveu, sobreviveu, desenvolveu sua singularidade.  

Se fôssemos levar a sério o que os princípios de verdade (documentos da abordagem psi) proclamam como “loucura”, não sairíamos mais de casa ou olharíamos no espelho.

Um exemplo: entre 1863 e 1864, no centro de Porto Alegre, quando ocorreram fatos conhecidos como: os crimes da rua do Arvoredo (hoje Fernando Machado), ou seja, José Ramos e sua esposa Catarina Palse, aliados com o açougueiro alemão Carlos Klaussner, produziam e vendiam linguiças de carne humana. José e Catarina foram condenados por 2 assassinatos em abril de 1864. Os demais crimes ficaram extraviados para a memória.

Reza a lenda que a demora na descoberta dos fatos, ocorreu pelo sucesso das linguiças na capital gaúcha. Existem depoimentos - clandestinos - que afirmavam ser a carne mais saborosa até então experimentada. Algo semelhante (canibalismo) aconteceu na queda do avião nos Andes em outubro de 1972. Talvez a diferença seja a natureza dos argumentos utilizados, a prática é a mesma.

No outro lado do oceano, na festejada Europa, berço de espécimes como: Calígula, Napoleão, Nero, Hitler, Mussolini, Stálin, Franco... Ainda nos dias de hoje, as guerras e genocídios proliferam, sob os mais arrazoados argumentos. Práticas atrozes, que, muitas vezes, se refugiam em diagnósticos psiquiátricos, para não responder por seus crimes.  

A questão metodológica – mais uma vez – se apresenta como um divisor de águas, ou seja, ao interditar alguém num Instituto Psiquiátrico Forense (na ausência deste, um hospital psiquiátrico ou geral pode servir), com um diagnóstico de doença mental, sob muitos aspectos, se livra o assassino ou criminoso de guerra do cumprimento integral da pena.

Lembro um hospital psiquiátrico, comprado por facções criminosas no Brasil, para que pudessem enviar para lá alguns comparsas, como: matadores de aluguel, pois assim teriam uma vida melhor, inclusive com facilidades para fuga. Tudo dentro da lei. Desde o diagnóstico psiquiátrico à sentença judicial e o cumprimento da pena.  

René Descartes (séc. XVII) ensina: “As maiores almas são tanto capazes dos maiores vícios como das maiores virtudes”. Sei que existem almas como Mahatma Gandi, Martin Luther King, e muitas outras.

Se pensarmos com Maquiavel ou Thomas Hobbes, abraçamos a tese de que a natureza humana é essencialmente má. Se entendermos o homem com Rousseau ou Marx, iremos acreditar que as pessoas nascem boas, mas a sociedade as corrompe. Ainda àquelas que acreditam no “anjinho barroco” e suas derivações, as quais se deve levar em conta, enquanto for possível. Sem contar os anjos e demônios disfarçados que andam por aí.   

Aquele abraço,

*hs

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 14*

 

                                    Quem ou o que significa você? 

Outro dia uma partilhante compartilhou um evento ocorrido quando da sua primeira sessão com o psicanalista. Algo que a fez buscar outra abordagem terapêutica.

Dizia ela: “O analista, alguém que eu nunca tinha visto antes, na primeira sessão, após as palavras iniciais, orientou que me deitasse no divã e ficasse à vontade. A seguir, como faço em minha casa, tirei as sandálias e me deitei confortavelmente. Imediatamente o doutor fez a seguinte afirmação: ‘sei, sei, tu estás querendo me seduzir mostrando teus pés (...)’. Isso me fez muito mal, pensei que eu tinha ido ao lugar errado...”

Esse exemplo - tenho muitos outros - serve como reflexão metodológica do que não fazer em Filosofia Clínica. Um alerta a quem segue indiscriminadamente as hegemonias e as modas do momento, os agendamentos da publicização e outros aspectos da ideologia dos princípios de verdade.

Vejo esse relato como uma questão de método, ou seja, como se apresenta numa abordagem de hermenêutica interpretativa, de onde um saber-poder especialista (psicanalítico), refere saber mais sobre seu paciente do que ele próprio. A partir de então, este fica refém das interpretações e significados do outro. 

Levando-se em conta a fragilidade existencial desses momentos de ressignificação, a problemática se amplia, no que diz respeito as distorções que a pessoa é alvo. Noutras palavras, afastando, cada vez mais, a possibilidade de ser sujeito em uma história que deveria lhe pertencer por inteiro.

Usando expressões do método utilizado com a paciente, percebo um sadismo controlador nessa espécie de abordagem, quando se desrespeita a matéria-prima dos atendimentos, com significados, distorções, agendamentos, para desqualificar uma realidade em processo.       

No caso da partilhante, na continuidade das sessões, foi possível identificar o dispositivo de autodefesa que ela usou para desautorizar a invasão indevida ao seu território subjetivo. O tópico significado da estrutura de pensamento, quando associado a outros aspectos de uma autogenia, pode se traduzir como uma bateria antiaérea. Assim, um significado, na clínica filosófica, deve ser um evento de construção compartilhada, não uma atividade isolada do terapeuta.

A resultante de um processo clínico em Filosofia se apresenta numa via de mão dupla, elaborada cuidadosamente, desde os instantes iniciais dos atendimentos. Depois disso, os exames categoriais - na versão partilhante - constituem o chão por onde se poderá compreender a natureza e o funcionamento da estrutura de pensamento, bem como suas possibilidades de um ser singular em processo.

Não é mágica ou propaganda enganosa! É trabalho e método, além, é claro, do imprescindível borogodó!

Aquele abraço,

*hs

terça-feira, 9 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 13*

                                      Qual diagnóstico te representa ?

Existe um fenômeno que se apresenta nas telas de tv, cinema, por onde um expectador, ao ingressar num território nem sempre favorável à sua singularidade, fica refém de seus agendamentos.   

O conteúdo de um roteiro dramático, costuma cair no gosto de muitas pessoas, levando-as a ter ideias e sensações conhecidas ou desconhecidas. De qualquer forma, ninguém sai o mesmo de um mergulho em algo assim descrito (a menos que durma), onde a escolha da obra já delimita o alcance da interseção.   

Recordo alguns clássicos: Um estranho no ninho (1975), Hair (1979), Blade Runner – o caçador de androides (1982), O pescador de ilusões (1991), Don Juan de Marco (1995), O Quatrilho (1995), Shine – brilhante (1996), Gênio indomável (1997), O encantador de cavalos (1998), Path Adams – o amor é contagioso (1998), Garota interrompida (1999), Encontrando Forrester (2000), Náufrago (2000), Pão e tulipas (2000), Doce novembro (2001) ... Apontam para o cuidado sobre a relação do autoconhecimento e os desdobramentos - na vida de cada um - dessas vivências.   

Um roteiro cinematográfico, ao retirar sua fonte de inspiração da lida cotidiana ou da imaginação de um autor, indo dos rascunhos ao momento da partilha com seu público, oferece múltiplas experiências pela via dos deslocamentos intelectivos. Os impactos de um filme na vida de uma pessoa, costuma modificar seu viés de realidade pelos agendamentos da película.

Os profissionais da área clínica (Filósofos clínicos, Psicoterapeutas, Psicanalistas), apesar do distanciamento metodológico, vivenciam situações semelhantes em seu dia a dia, ao conviver com os dramas e tragédias de seus partilhantes, clientes, pacientes, em seus espaços de trabalho. Nesse sentido, cabe destacar, mesmo levando-se em conta a maestria de roteiristas e diretores, a distância abismal da hora-sessão para a hora-cinema.

Em um texto: “o cuidado do cuidador” (A palavra fora de si, 2017), recordo a preocupação em acolher profissionais que tem um cotidiano de intervenção clínica em consultórios, hospitais gerais, manicômios, escolas, empresas, pois, muitas vezes, se encontram desamparados, ao não encontrar um refúgio eficaz para reabastecer seu papel existencial cuidador.

Vejo com apreensão algumas notícias, que dão conta desse fenômeno invisível, onde profissionais da área terapêutica, adoecem (fisicamente) com diagnósticos como: ‘doença autoimune’ e outros, sem a possibilidade de uma intervenção clínica anterior (prevenção) a um processo de somatização radical. A medicina do corpo ainda padece do código internacional de doenças.  

Aquele abraço,

*hs

domingo, 7 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 12*

                                     Por onde se diz aquilo que não fala?

O cotidiano dos atendimentos compartilha múltiplos fenômenos ao filósofo clínico. Seu viés de acolhimento e cuidados encontra na redução fenomenológica, um fundamento para encontrar o sujeito singular.  

Um desses eventos ocorre quando a intencionalidade partilhante - em sua narrativa - oferece conteúdos além do que tinha previsto dizer na hora sessão. Sendo a fala a semiose por onde a pessoa se diz, não é raro sua expressividade revelar algo mais, por um filtro que lhe escapa num viés de momento.

Merleau-Ponty auxilia: “(...) um homem no trabalho, que reencontra toda manhã, na configuração que as coisas readquirem sob seus olhos, o mesmo apelo, a mesma exigência, a mesma incitação imperiosa à qual jamais acabará de responder. Sua obra não termina: está sempre no futuro.” (A prosa do mundo, 2002. Pág. 94).

A percepção da incompletude discursiva, compartilha uma ótica aprendiz, numa geografia subjetiva que não cessa de desdobrar-se. Assim é possível entender o fenômeno da intencionalidade como filtro, o qual se ativa ao encontrar um lugar e uma interseção para esgaçar a lógica conhecida.  

Esse caráter de imprevisibilidade retórica, é um dos meios por onde o partilhante pode ensaiar suas buscas existenciais, descobrindo ou inventando nuances que lhe representem. O olhar de escuta atenta do filósofo, deverá compreender esses deslizes como uma emancipação da pessoa em direção a ela mesma.   

Em Merleau-Ponty: “(...) é o preço que se deve pagar para ter uma linguagem conquistadora, que não se limite a enunciar o que já sabíamos, mas nos introduza a experiências estranhas (...). Jamais veríamos uma paisagem nova se não tivéssemos com nossos olhos, o meio de surpreender, de interrogar e de dar forma a configurações de espaço e de cor jamais vistas até então.” (A prosa do mundo, 2002. Pág. 119).

A clínica, sob muitos aspectos, se assemelha a um encontro da pessoa diante do espelho. Aquilo que se vê sendo a mirada provisória de um instante, não irá oferecer a totalidade de uma visão - se é que isso existe -, mas um determinado ângulo numa autogenia em processo.

O dado de semiose por onde alguém significa sua condição, quando identificado e acolhido num espaço de liberdade expressiva, aprecia experienciar àquilo que sua cultura lhe interdita.   

A característica do espanto filosófico, própria dos filósofos precursores, caminha junto a lida de consultório, desde a fase preliminar aos desdobramentos das sessões, como uma aliada das novas configurações da singularidade diante de si sendo outra.  

Aquele abraço,

*hs

sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 11*

 

                            Novos paradigmas e o saber incomum 

No âmbito da ciência, um novo modelo de entendimento das coisas aprecia surgir como dúvida, contradição, caos precursor. Ao experienciar um território virginal de atuação e desenvolvimento, questiona os rituais do totem reconhecido.  

Um aspecto é a percepção de alguns personagens num determinado meio, onde se começa a perceber fissuras, cada vez maiores, na relação da ciência normal com seu objeto de trabalho. Quando algumas pessoas modificam seu ângulo de visão, podem redescobrir algo novo, onde antes se via sempre as mesmas coisas.

O novo olhar revela possibilidades, até então, desconsideradas. Seu viés de alma nova, em busca de qualificar pressupostos, atua de forma - inicialmente - clandestina. É importante destacar que as metodologias hoje hegemônicas, quando de seu aparecimento, enfrentaram obstáculos semelhantes.

Thomas Kuhn esclarece: “(...) durante as revoluções, os cientistas veem coisas novas e diferentes quando, empregando instrumentos familiares, olham para os mesmos pontos já examinados anteriormente. É como se a comunidade profissional tivesse sido subitamente transportada para um novo planeta, onde objetos familiares são vistos sob uma luz diferente (...).” (A estrutura das revoluções científicas, 2013. Pág. 201).

O espaço que se abre, diz respeito aos inúmeros fracassos de uma tese, diante do esgotamento de sua abordagem. A transição de um modelo a outro reivindica um tempo para se deslocar e sustentar esse movimento de superação.   

A cegueira institucional aqui lembrada, não trata de não ver, mas de um ver que não enxerga ou, se enxerga, desmerece, desvirtua, para manter seu lugar de privilégios. Por outro lado, para desenvolver um saber extraordinário, a crise costuma associar um pequeno grupo de mentes brilhantes.

Kuhn refere: “Os cientistas falam frequentemente de ‘vendas que caem dos olhos’ ou de uma ‘iluminação repentina’ que ‘inunda um quebra-cabeça’ que antes era obscuro, possibilitando que seus componentes sejam vistos de uma nova maneira.” (A estrutura das revoluções científicas, 2013. Pág. 215).

Nesse sentido, é raro se ter um grupo significativo de especialistas dispostos a renunciar a uma zona de conforto para lidar com eventos fora da curva. Talvez seja necessário, ao pensador dos novos paradigmas, que tenha alma filosófica, traga consigo um viés de admiração, abertura reflexiva, trânsito pelos deslimites de sua área, incluindo o diálogo com as absurdidades de um saber incomum.    

Aquele abraço,

hs    

segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 10*

 

                                 O que você vai ser quando crescer? 

Uma relação da expressividade com os princípios de verdade é seu caráter de rebeldia, inquietude criativa, contradição afirmativa, num devir que se instala como diferença naquilo que não a representa.

As buscas por sustentação de um estado de espírito assim pensado, costuma encontrar nos freios existenciais (família, escola, igreja, ideologia política...) mordaças significativas. Ainda assim, reivindica uma singularidade íntegra com seus trânsitos de ser e não-ser.

Michel Maffesoli compartilha: “O paradoxo é a marca essencial desses momentos cruciais, nos quais o que está em estado nascente tem muita dificuldade para se afirmar diante dos valores estabelecidos.” (Sobre o nomadismo – vagabundagens pós-modernas, 2001. Pág. 21).

A questão que se reapresenta, muitas vezes, na hora-sessão, é esse enfrentamento da pessoa com suas paredes de aspecto sem porta ou janela. Talvez por isso a terapia possua um caráter revolucionário, aliada dos transbordamentos em curso.

No entanto, o viés institucional oferece um caminho pré-estabelecido, pela repetição incessante de determinadas verdades, valores, ideologias, normas sociais, por veículos comprometidos com a sustentação de suas cercas e muros.   

Michel Maffesoli indica: “(...) nenhum problema é definitivamente resolvido, mas que encontramos, pontual e empiricamente, respostas aproximadas, pequenas verdades provisórias, postas em prática no cotidiano, sem que se acorde um estatuto universal, oralmente válido em todo lugar, em todo tempo, e para cada um.” (O instante eterno, 2003. Pág. 81).

Ao encontrar a Filosofia Clínica (ou será que foi ela que me achou?) e sua mensagem de caráter libertário, percebi seu teor revolucionário, ou seja, ao acolher e cuidar de uma pessoa, em seus dias de caos transformador, poderia contribuir com seu processo de autoconhecimento para uma originalidade que a representasse por inteiro.

Uma referência subjetiva de integração de alguém consigo mesmo, costuma agendar e modificar as coisas ao seu redor. Ao mudar seu mapa subjetivo, essa reapresentação descreve um cotidiano peculiar. É possível ser a maior de todas as revoluções – não àquela das armas, dos exércitos – mas um processo de autodescoberta de uma pessoa, ao ter o reflexo no espelho como sujeito de sua história.

Aquele abraço,

*hs