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domingo, 7 de janeiro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 12*

                                     Por onde se diz aquilo que não fala?

O cotidiano dos atendimentos compartilha múltiplos fenômenos ao filósofo clínico. Seu viés de acolhimento e cuidados encontra na redução fenomenológica, um fundamento para encontrar o sujeito singular.  

Um desses eventos ocorre quando a intencionalidade partilhante - em sua narrativa - oferece conteúdos além do que tinha previsto dizer na hora sessão. Sendo a fala a semiose por onde a pessoa se diz, não é raro sua expressividade revelar algo mais, por um filtro que lhe escapa num viés de momento.

Merleau-Ponty auxilia: “(...) um homem no trabalho, que reencontra toda manhã, na configuração que as coisas readquirem sob seus olhos, o mesmo apelo, a mesma exigência, a mesma incitação imperiosa à qual jamais acabará de responder. Sua obra não termina: está sempre no futuro.” (A prosa do mundo, 2002. Pág. 94).

A percepção da incompletude discursiva, compartilha uma ótica aprendiz, numa geografia subjetiva que não cessa de desdobrar-se. Assim é possível entender o fenômeno da intencionalidade como filtro, o qual se ativa ao encontrar um lugar e uma interseção para esgaçar a lógica conhecida.  

Esse caráter de imprevisibilidade retórica, é um dos meios por onde o partilhante pode ensaiar suas buscas existenciais, descobrindo ou inventando nuances que lhe representem. O olhar de escuta atenta do filósofo, deverá compreender esses deslizes como uma emancipação da pessoa em direção a ela mesma.   

Em Merleau-Ponty: “(...) é o preço que se deve pagar para ter uma linguagem conquistadora, que não se limite a enunciar o que já sabíamos, mas nos introduza a experiências estranhas (...). Jamais veríamos uma paisagem nova se não tivéssemos com nossos olhos, o meio de surpreender, de interrogar e de dar forma a configurações de espaço e de cor jamais vistas até então.” (A prosa do mundo, 2002. Pág. 119).

A clínica, sob muitos aspectos, se assemelha a um encontro da pessoa diante do espelho. Aquilo que se vê sendo a mirada provisória de um instante, não irá oferecer a totalidade de uma visão - se é que isso existe -, mas um determinado ângulo numa autogenia em processo.

O dado de semiose por onde alguém significa sua condição, quando identificado e acolhido num espaço de liberdade expressiva, aprecia experienciar àquilo que sua cultura lhe interdita.   

A característica do espanto filosófico, própria dos filósofos precursores, caminha junto a lida de consultório, desde a fase preliminar aos desdobramentos das sessões, como uma aliada das novas configurações da singularidade diante de si sendo outra.  

Aquele abraço,

*hs

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