Onde você aprende o que sabe?
Os anos de convívio com pessoas à
margem, vem me ensinando sobre a existência de um amplo território virginal,
desconhecido, no qual atuam diferentes forças materiais e imateriais.
Ainda lembro do meu segundo texto
em papel, publicado pela editora E-Papers/RJ em 2009, intitulado: “Filosofia
Clínica – Diálogos com a lógica dos excessos”, naquela época vinha de uma
imersão em hospitais psiquiátricos. Nas páginas iniciais escrevi: “Dedico
esta obra à multidão exilada em cada um.”
Reconheço a atualidade dessa
dedicatória, pois o cotidiano dos atendimentos se reapresenta como um processo
de libertação das expressividades, em seu encontro com o novo referencial
teórico-prático.
Mattew Pearl ensina: “(...) os
primeiros murmúrios de uma nova verdade não são captados pelos que necessitam
de amplificadores de ouvido.” (O clube Dante, 2005. Pág. 223).
É o caso dos novos paradigmas que
brotam - silenciosamente - das fissuras e contradições da ciência normal
(Thomaz Kuhn). Esta, ao não dar conta do fenômeno humano em vias de
ressignificação pessoal, trata de internar, medicalizar, desconstituir o sujeito
em forma de objeto. Passa longe de enxergar os remédios que a própria pessoa oferece
a si mesma em seu caos transformador (questão de método).
Maurice Blanchot lembra
Nietzsche: “(...) uma forma tal marca sua recusa de sistema, sua paixão pelo
inacabado, o fato de pertencer a um pensamento (...) ela esteja ligada à
mobilidade da pesquisa, ao pensamento viajante – o de um homem que pensa
caminhando e segundo a verdade do caminhar.” (A conversa infinita – a
experiência limite, 2007. Pág. 115).
Meus professores são meus alunos,
partilhantes, e os discursos midiáticos impregnados de “comprovação
científica”. Daí consigo qualificar o papel existencial cuidador, investigador,
bem assim a expressividade de acordo com a natureza, o alcance, a possibilidade
das interseções. Aprecio a invisibilidade do trabalho que desenvolvo, pois
mantém uma capa de proteção para prosseguir atuando na periferia e contraponto
da normal idade, a qual insiste em submeter o que não for espelho. Aprendi
bem mais no convívio com as pessoas internadas, do que em anos frequentando
escolas, seminários, congressos, universidades.
O devir existencial acolhe uma
metodologia que a compreende, como cumplicidade e reconhecimento de suas
mensagens, refugiadas num amanhã que se esboça diante de si mesma sendo outra. Nesse
sentido, uma investigação crítica, reflexiva, analítica, capaz de
desenvolver-se em meio a tanta desinformação ideológica, reivindica uma
hermenêutica compreensiva, para, preliminarmente, acolher o estranho absurdo presente
no dia a dia, como companhia da mesma viagem.
Aquele abraço,
*hs