Um farfalhar de coisas antigas
Um dos achados significativos da
nova abordagem da Filosofia Clínica, foi sua metodologia apta a se relacionar
com as pessoas, tendo em vista um certo princípio da indeterminação, ou
seja, o filósofo clínico a priori sabe que não sabe, mas busca, pela via
da interseção clínica, conhecer e aprender com seu partilhante sobre sua
condição singular em processo.
Uma de suas buscas é acessar a
farmácia subjetiva do partilhante, para identificar os venenos e contravenenos
com os quais irá lidar na dialética da terapia. Nesse ponto das atividades
clínicas, é preciso aprender a língua na qual a pessoa se diz, por onde se diz, ainda quando se
cala. Os tempos, lugares, momentos, relações, onde sua estrutura de
pensamento respira, transpira, não pira.
A retórica da ciência normal, sustentada
com pompa e circunstância no convívio contemporâneo com os novos paradigmas, tratam
de desmerecê-los, fazer de conta que não existem ou se existem, são
insignificantes. Não percebem seu barco epistemológico fazendo água.
Fritjof Capra lembra Werner Heisenberg:
“O grande feito de Heisenberg foi expressar essas limitações dos conceitos
clássicos de uma forma matematicamente precisa – que hoje leva seu nome e é
conhecida como princípio de indeterminação. (Sabedoria incomum, 1988.
Pág. 15).
Assim é possível entender a miopia de muitos pesquisadores do nosso tempo, os quais se veem
impedidos de enxergar algo mais, que não seja a continuidade de uma ciência
normal (Thomas Kuhn). Suas lentes cristalizadas em uma só direção enxergam -
tão somente - o que seu ângulo de visão permite ver. Sem contar as narrativas
voltadas aos interesses econômicos, ideológicos, políticos.
A Filosofia Clínica, longe de ser
uma resposta definitiva para qualquer coisa, se apresenta como uma proposta aprendiz
sobre a condição humana singular. Sua tez de atividade artesanal, reapresenta,
sob muitos aspectos, o reflexo incessante das águas de Heráclito.
Uma aproximação com o
fenômeno partilhante em consultório, reivindica um ajuste permanente ao visar
de escuta do filósofo clínico. Os estudos compartilhados seguem durante o
processo da terapia, por onde um e outro visitam seus jardins subjetivos para
conhecer e qualificar as possibilidades existenciais do lado a lado da
interseção.
Capra com Heisenberg: “O
princípio de indeterminação mede o grau em que o cientista influencia as
propriedades dos objetos observados pelo próprio processo de mensuração.”
(Sabedoria incomum, 1988. Pág. 15).
Por outro lado, na mesma direção,
a presença do filósofo clínico, pela via da redução fenomenológica, e sua
disposição de um acolhimento aprendiz em uma investigação compartilhada, atribuem
qualidades diferenciadas ao encontro terapêutico.
Esse aspecto da Filosofia Clínica
aparece como um ingrediente para se compreender a natureza de sua fundamentação
teórico-prática, ainda quando as palavras sejam limitadas para descrever os
eventos de consultório. A hora-sessão costuma se caracterizar como um espaço de
ensaios, construções compartilhadas, sensações, desdobramentos de significado,
e algo mais.
Algumas vezes, é possível sentir
um farfalhar de coisas antigas, a ressoar tão próximo. Se assemelha a voz das
mentes brilhantes, um pouco antes de se chegar aqui, para uma interseção
cúmplice com os dias de hoje. Uma animação indeterminada se esboça no sem-fim
de quase tudo.
Aquele abraço,
hs
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