Notas para um refúgio singular
Existem indícios sobre ser a
poesia uma das formas de conexão do infinito com as pessoas. No mesmo sentido a
suspeita de que, ao reconhecer sua singularidade, possam desenvolver um devir inédito
no convívio com outras na mesma condição. Onde ser único não seria uma síndrome,
um transtorno, mas um jeito de ser e existir inclassificável, por ser único. Teríamos nome e sobrenome, não tipologias ou protocolos distantes de nossa realidade em processo. Questão
de método!
Os princípios de verdade usam os
meios ao seu dispor para divulgar e sustentar seus pontos de vista, mesmo que
para isso, a cada novo dia, invente nomenclaturas para abordar e controlar originalidades
em vias de nascimento. Mais que uma questão de método, muitas vezes, é
possível perceber-se uma ideologia a sustentar práticas com interesses de
natureza econômica.
A medicina do corpo, ao oferecer
sua metodologia bem-sucedida nas questões materiais, enfrenta dificuldades no
que diz respeito as questões imateriais do fenômeno humano. Alegam ser um
atributo da Filosofia, Teologia, Antropologia. Assim se veem livres da investigação
filosófica, por exemplo, a qual poderia ser aliada se apropriadamente
trabalhada em uma relação interdisciplinar.
No entanto, ao inventar doenças
mentais que não aparecem em exames clínicos, o que se apresenta, com
fartura de propaganda, é uma sucessão de classificações, estigmas, que parecem
fazer sentido para pessoas sem um senso crítico, reflexivo, tão comum em nosso
tempo.
Veja-se o caso da bíblia DSM,
inventada por uma cultura diferente da nossa, no entanto, encontrou adeptos no
Brasil, como se aquilo que vem de outros lugares fosse melhor, desconhecendo nossa cultura repleta de talentos, gênios criativos, desprezados, possivelmente, por
ser contemporâneos da vida normalizada.
As estruturas de saber-poder,
como ensina Michel Foucault em seu texto O nascimento da clínica, tentam
se manter a qualquer custo, dificultando a inovação, a inquietude criativa, em alguns
campos da pesquisa científica. Parece existir um receio, uma insegurança, um
medo de que as novas ideias possam tomar o lugar de autenticação da ciência, ora
em vias de ser superada, pela própria ciência.
Nesse sentido não é surpreendente
que os novos paradigmas surjam em ambientes de liberdade aos estudos, pesquisa,
diálogos inter e transdisciplinares, de onde costumam brotar novos saberes,
críticas, reflexões, publicações. Ainda assim, como informa Thomas Kuhn na sua A
estrutura das revoluções científicas, essa nova forma de enxergar, sentir,
descrever o mundo, ao oferecer uma nova direção reflexiva e investigativa para o
fenômeno humano, também reinventa o mundo das ideias, das práticas empíricas, e
a abordagem de determinadas problemáticas existenciais.
As poéticas da singularidade, tendo
em vista essa realidade, encontram pontos de interseção na natureza ao seu
redor, para conviver com suas estéticas numa forma originária, onde possam se
expressar em linguagem própria.
Assim sendo, muitas vezes, tratam
de ficar invisíveis ao olho nu de suas circunstâncias, as quais repletas de distorções,
aprisionam seu aparecimento com as mordaças da definição. Talvez ao ser
marginal, periférica, viajando na invisibilidade de um triz, sua condição
desconhecida possa seguir indefinida para um grau diferenciado de expressividade.
Um endereço para reconhecer e
traduzir pontos de interseção, lugares, linguagens, momentos para ensaios de um
discurso existencial singular. Com essa condição irrepetível, redigir um esboço
pessoal em linguagem própria, em rotas de não-ser, pelas frestas daquilo que
lhe desautoriza.
Aquele abraço,
hs
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