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segunda-feira, 17 de junho de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 35*

                                                 Síndrome de vira-lata? 

É interessante notar o fato de que, no Brasil, algumas armadilhas conceituais volta e meia se reapresentam, em nova roupagem, reagendando suas máximas as novas gerações. Como a verdade enraizada de que o que é bom vem do exterior, de longe. Ou que a língua universal é o inglês, ou os estilos de escrita, pintura, teatro, a forma de compor músicas, as roupas da moda. Divulga-se (com fartura de agendamentos) o que vem de outro lugar como algo melhor.    

Foi Nelson Rodrigues que, após a derrota do Brasil para o Uruguai na final da copa do mundo de futebol em 1950, em pleno Maracanã, cunhou a expressão: complexo de vira-lata.  

Em campos de atuação como a antropologia, sociologia, filosofia clínica e outras, embora seu amplo espectro de aplicabilidade e inserção junto as pessoas de seu meio (bairro, distrito, cidade, estado), ainda padecem de ter que escutar coisas como: isso é muito bom! Só pode ter vindo da Europa, dos USA.   

Agora, então, imagine um novo paradigma como a invenção do rádio e o telefone (Pe. Landell de Moura, 1893), o avião (Santos Dumont, 1901), a radiografia (Manuel de Abreu, 1936), a máquina de escrever (Pe. João Francisco de Azevedo, 1861), a Filosofia Clínica (Lúcio Packter, 1990), sendo a maioria autodidata ou oriunda de outras áreas, com rara participação acadêmica.  

Thomas Kuhn ajuda a entender o fenômeno: “Qualquer nova interpretação da natureza, seja ela uma descoberta, seja uma teoria, aparece inicialmente na mente de um ou mais indivíduos. São eles os primeiros a aprender a ver a ciência e o mundo de uma nova maneira.” (A estrutura das revoluções científicas, 2013. Pág. 241).

No caso das ciências humanas, especificamente na área de atuação das especialidades de base Psi, o que se testemunha é uma incompetência generalizada (questão de método) em compreender o fenômeno da singularidade.

Seja qual for o motivo (limitação nos estudos, acomodação profissional, dependência econômica), esse aspecto de se rechaçar a novidade (não contemplada pela ciência normal), torna-se um empecilho para o acolhimento e desenvolvimento dos novos modelos de compreensão e intervenção na realidade.

A metodologia ensinada em escolas, universidades, institutos de formação, com suas tipologias, classificações, a dependência da psicofarmacologia, passam longe de acolher a pessoa em seu contexto de ser inédito. Um exemplo disso é a multiplicação de síndromes, distúrbios, pelo fato de não se admitir e reconhecer uma abordagem capaz de superar as verdades de pretensão científica que chegam do outro lado do Atlântico.

Arnaldo Jabor compartilha: “Fisiológicos seculares, patrimonialistas, teimosos, arrogantes, malandros, ignorantes, prepotentes, apenas nos resta pensar: o que nos falta desaprender para chegar a um ideal de país? Como faremos para chegar ao futuro de uma desilusão? Quantas décadas levaremos para desaprender toda a estupidez que cultivamos durante 400 anos?” (Jornal O Globo, 20 de janeiro de 2001).

Nos dias de hoje, é comum professores indicarem tratamento psicológico e psiquiátrico aos alunos divergentes, muitas vezes incomodados com os conteúdos distantes de sua área de interesse, turmas superlotadas, professores despreparados e desmotivados para a sala de aula. Sem contar a proliferação de questões familiares, interesses, disputas. Assim, parece cômodo diagnosticar – autismo, pânico, burnout – as doenças da moda, como justificativa ao fracasso na convivência com o fenômeno da singularidade.  

Aquele abraço,

*hs  

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