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Você está no espaço Descrituras. Aqui encontrará alguns textos publicados, inéditos e outros esboços de minha autoria. Tratam-se de manuscritos para estudo e pesquisa. Desejo boas leituras.

historicidade das publicações

sábado, 5 de outubro de 2024

Filosofia Clínica Agridoce 43

 

                                   Um farfalhar de coisas antigas

Um dos achados significativos da nova abordagem da Filosofia Clínica, foi sua metodologia apta a se relacionar com as pessoas, tendo em vista um certo princípio da indeterminação, ou seja, o filósofo clínico a priori sabe que não sabe, mas busca, pela via da interseção clínica, conhecer e aprender com seu partilhante sobre sua condição singular em processo.

Uma de suas buscas é acessar a farmácia subjetiva do partilhante, para identificar os venenos e contravenenos com os quais irá lidar na dialética da terapia. Nesse ponto das atividades clínicas, é preciso aprender a língua na qual a pessoa se diz, por onde se diz, ainda quando se cala. Os tempos, lugares, momentos, relações, onde sua estrutura de pensamento respira, transpira, não pira.     

A retórica da ciência normal, sustentada com pompa e circunstância no convívio contemporâneo com os novos paradigmas, tratam de desmerecê-los, fazer de conta que não existem ou se existem, são insignificantes. Não percebem seu barco epistemológico fazendo água.

Fritjof Capra lembra Werner Heisenberg: “O grande feito de Heisenberg foi expressar essas limitações dos conceitos clássicos de uma forma matematicamente precisa – que hoje leva seu nome e é conhecida como princípio de indeterminação. (Sabedoria incomum, 1988. Pág. 15).  

Assim é possível entender a miopia de muitos pesquisadores do nosso tempo, os quais se veem impedidos de enxergar algo mais, que não seja a continuidade de uma ciência normal (Thomas Kuhn). Suas lentes cristalizadas em uma só direção enxergam - tão somente - o que seu ângulo de visão permite ver. Sem contar as narrativas voltadas aos interesses econômicos, ideológicos, políticos.   

A Filosofia Clínica, longe de ser uma resposta definitiva para qualquer coisa, se apresenta como uma proposta aprendiz sobre a condição humana singular. Sua tez de atividade artesanal, reapresenta, sob muitos aspectos, o reflexo incessante das águas de Heráclito.

Uma aproximação com o fenômeno partilhante em consultório, reivindica um ajuste permanente ao visar de escuta do filósofo clínico. Os estudos compartilhados seguem durante o processo da terapia, por onde um e outro visitam seus jardins subjetivos para conhecer e qualificar as possibilidades existenciais do lado a lado da interseção.

Capra com Heisenberg: “O princípio de indeterminação mede o grau em que o cientista influencia as propriedades dos objetos observados pelo próprio processo de mensuração.” (Sabedoria incomum, 1988. Pág. 15).

Por outro lado, na mesma direção, a presença do filósofo clínico, pela via da redução fenomenológica, e sua disposição de um acolhimento aprendiz em uma investigação compartilhada, atribuem qualidades diferenciadas ao encontro terapêutico.

Esse aspecto da Filosofia Clínica aparece como um ingrediente para se compreender a natureza de sua fundamentação teórico-prática, ainda quando as palavras sejam limitadas para descrever os eventos de consultório. A hora-sessão costuma se caracterizar como um espaço de ensaios, construções compartilhadas, sensações, desdobramentos de significado, e algo mais.

Algumas vezes, é possível sentir um farfalhar de coisas antigas, a ressoar tão próximo. Se assemelha a voz das mentes brilhantes, um pouco antes de se chegar aqui, para uma interseção cúmplice com os dias de hoje. Uma animação indeterminada se esboça no sem-fim de quase tudo.  

Aquele abraço,

hs